Desabamento de duas
barragens de rejeitos das mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton: crime hediondo
premeditado e pecado grave anunciado.
Por frei Gilvander Moreira, da CPT.
Sobre o desabamento de duas barragens de
rejeitos, Fundão e Santarém, da Vale S/A e BHP Billiton – maior mineradora do
mundo – operado pela Samarco no Município de Mariana, MG, ontem, dia 05 de
novembro de 2015, tenho que dizer. Primeiro, nosso abraço solidário a todas as
famílias vítimas direta e indiretamente e nosso pedido de perdão a toda a
natureza devastada. Em segundo lugar, assim que ouvi a dolorosa notícia do
desabamento das duas barragens, enquanto acompanhava o julgamento de Antério Mânica,
ex-prefeito de Unaí, MG, pelo PSDB, que foi condenado a 100 anos de prisão por
ter sido um dos quatro mandantes da chacina dos fiscais em Unaí, dia
28/01/2004, veio imediatamente à minha mente o seguinte.
Há fortes indícios de que uma barragem de rejeito
da SAMARCO em Matipó, MG, seja uma das principais causas de câncer em muita
gente na cidade de Matipó, porque a barragem vaza para o rio Matipó metais
pesados – chumbo, arsênio e Mercúrio - e a COPASA capta água um pouco abaixo
para abastecer a cidade de Matipó. Essa denúncia foi feita na Assembleia
Legislativa, em 2004, quando tocávamos uma CPI sobre a Mina Capão Xavier, da
MBR/Vale, em Nova Lima, MG.
Há alguns anos atrás o ex-deputado Célio
Moreira, da base de sustentação do PSDB, então presidente da Comissão de Meio
Ambiente da Assembleia Legislativa de MG, em uma audiência pública, entregou
medalha ao diretor presidente da mineradora Samarco por ser, segundo ele, uma
empresa responsável socioambientalmente. Na época, estranhamos isso e denunciamos:
como pode um deputado, presidente de Comissão do Meio Ambiente, homenagear uma mineradora?
Quando desabou uma barragem da mineradora Rio
Pomba Cataguazes, na Zona da Mata de MG, saiu nos jornais que a FEAM (Fundação
Estadual do Meio Ambiente) afirmou que das mais de 600 barragens de rejeitos de
mineração existentes em Minas Gerais havia risco de desabamento em mais de 450
barragens. O órgão do Governo de MG estava admitindo que estamos diante de
muitos outros crimes hediondos anunciados.
Uma diretora da FEAM, Bárbara, declarou na
CPI da Mina Capão Xavier na ALMG que “a FEAM não fiscaliza nenhuma mineradora.
São funcionários das mineradoras que fazem os relatórios e nós da FEAM apenas
lemos os relatórios.” Mudou algo com o PT no governo de MG?
A Samarco duplicou ou triplicou o mineroduto
de Mariana ao Espírito Santo, porque duplicou ou triplicou a produção de
minério e, assim, triplicou também a dizimação das águas de Minas. Por isso
estava ampliando uma das barragens de rejeito em Bento Rodrigues.
Parecer que o Ministério Público, em 2013, anexou
ao processo de renovação de Licença de Operação alertava para risco de
rompimento da barragem, em Mariana. Diz o parecer: "Notam-se áreas de
contato entre a pilha e a barragem. Esta situação é inadequada para o contexto
de ambas estruturas, devido à possibilidade de desestabilização do maciço da
pilha e da potencialização de processos erosivos", diz o relatório. Assim,
se há risco deve ser aplicado o princípio da precaução, a licença de operação
não poderia ser renovada pela FEAM em 29/10/2013.
Quais são os deputados financiados pelas
mineradoras?
O Governador Pimentel enviou para a
Assembleia Legislativa, em regime de urgência, o PL nº 2.946/2015, que
concentra o licenciamento ambiental nas mãos do executivo e restringe muito a
participação popular. As Mineradoras estão festejando esse projeto de Lei do
Pimentel.
A barragem do Fundão e a pilha de estéril
União da Mina de Fábrica Nova da Vale (LP+LI) fazem limite entre si,
caracterizando sobreposição de áreas de influência direta, com sinergia de
impactos.
Logo, o que aconteceu não foi um acidente e
nem apenas uma tragédia – resposta cruel que vem da natureza -, é um crime
hediondo premeditado e um pecado grave. As vítimas não são apenas ‘desabrigados’,
pois não perderam apenas seus abrigos. Perderam suas histórias, suas culturas,
seu ambiente, etc e etc: uma comunidade camponesa de agricultores familiares
que vivia harmonicamente com a natureza. Não imaginavam que mineradoras com
autorização do Estado tinham colocado uma bomba armada sobre suas cabeças. E se
o rompimento das barragens tivessem ocorrido às 03:00h da madrugada, quando estava
todo mundo dormindo? Teria morrido 600 pessoas.
Quais os (ir)responsáveis? Não apenas as
mineradoras Samarco, VALE e BHP Billiton (sócias), mas o Governo de Minas
Gerais por ter concedido o licenciamento ambiental e por não fiscalizar com o
rigor que o fiscal Nelson José da Silva fiscalizava os fazendeiros na região de
Unaí, no Noroeste de MG. Por isso o Governo de MG é cúmplice também. A
Assembleia Legislativa de MG também é cúmplice porque homenageou a Samarco na
Comissão de Meio Ambiente. E toda a sociedade, de alguma forma também é
cúmplice, seja por omissão ou por tolerar o intolerável.
O Clamor e as campanhas de solidariedade sem
dúvidas são muito bem vindos e louváveis neste momento de dor e perda, mas
precisamos levantar um clamor aos quatro cantos do mundo contra as mineradoras,
os processos de licenciamento e as permissões dos governos que, em nome do
capital e do progresso, matam o meio ambiente e o nosso povo.
Dizia Bertold Brecht (1898-1956): "Primeiro
levaram os negros, Mas não me importei com isso. Eu não era negro. Em seguida
levaram alguns operários, Mas não me importei com isso. Eu também não era
operário. Depois prenderam os miseráveis, Mas não me importei com isso. Porque
eu não sou miserável. Depois agarraram uns desempregados, Mas como tenho meu
emprego. Também não me importei. Agora estão me levando, Mas já é tarde. Como eu
não me importei com ninguém, Ninguém se importa comigo."
Sugiro que o Governo de MG cancele todas as
licenças ambientais da Samarco/Vale/BHP Billiton. Que seja bloqueado os
minerodutos da Samarco. Sugiro CPI das Mineradoras na ALMG e no Congresso
Nacional. Que o Governador Pimentel volte atrás antes que seja tarde demais e retire
o PL nº 2.946/2015 da ALMG e ouça as propostas dos movimentos socioambientais.
Já lamentamos vários desabamentos de várias
barragens de rejeitos de minério. Muitas pessoas já morreram e milhares foram
vitimizadas em Minas Gerais. Quantos outros rompimentos de barragens será
necessário para se ver a crueldade do predomínio da ação das mineradoras sobre
a dignidade humana e ecológica?
Enfim, feliz quem ouve os sinais dos tempos e
dos lugares.
Belo
Horizonte, MG, Brasil, 06/11/2015.
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