MANIFESTO DA AATR PELA
LIBERDADE DO CACIQUE BABAU, CONTRA A VIOLÊNCIA DO LATIFÚNDIO SOBRE OS POVOS DO CAMPO
CONTRA A PARALISAÇÃO DA
REFORMA AGRÁRIA.
Rosivaldo Ferreira da Silva, o Cacique Babau
Tupinambá, foi preso pela 4ª vez, desta vez em companhia de seu irmão, José
Aelson Jesus da Silva, Teity Tupinambá, no final da manhã da última
quinta-feira, dia 7 de abril de 2016, pela Polícia Militar da Bahia no
município de Olivença. Seguindo o roteiro das ocorrências anteriores, trata-se
de uma prisão política orquestrada por um conluio entre poderes estatais,
organizações de classe do agronegócio e a mídia local e nacional, num contexto
em que: (1) O Executivo não conclui a demarcação dos 47.000 hectares
identificados pela FUNAI como Terra Indígena Tupinambá de Olivença, que aguarda
desde 2009 a assinatura da Portaria Declaratória pelo Ministério da Justiça;
(2) O Legislativo local e mídia regional e nacional incita a população contra
os indígenas; (3) O Judiciário local, estadual e federal tem se manifestado de
forma escandalosamente parcial, atendendo ilegalmente a interesses de grileiros
e “empresários” da região.
A recente prisão das lideranças tupinambás
ocorre no momento em que a atuação do juiz federal de Ilhéus, Lincoln Pinheiro
da Costa, está sendo questionada pelos indígenas, pois o magistrado pressiona
ostensivamente por “acordos” entre indígenas e supostos proprietários, sempre
em prejuízo dos primeiros, pois chega ao cúmulo de propor uma demarcação não
contínua do território tradicional tupinambá, contrariando entendimento
consolidado pelo Supremo Tribunal Federal e a própria Constituição. É o mesmo
magistrado que tenta impor um acordo que beneficie empresários que tentam há
décadas usurpar as terras da comunidade quilombola de Graciosa, no município de
Taperoá, Baixo Sul da Bahia.
Em decisão de 12 de janeiro de 2016, Lincoln
Pinheiro da Costa concedeu liminar de reintegração de posse contra a Aldeia
Gravatá justamente pela não aceitação de acordo que impunha aos indígenas o
ônus de tolerar a extração de areia dentro do território tradicional, em
desrespeito a todo marco legal indigenista e causando severos danos ambientais.
A extração ilegal de areia na terra indígena já foi barrada por 03 vezes pelo
órgão ambiental e continua sendo liberada pelo juiz à revelia da Lei.
A absurda e inverossímil versão da Polícia
Militar afirma que as lideranças foram presas porque estariam “atirando pedras”
contra viaturas que escoltavam, por ordem do juiz, os caminhões liberados para
a criminosa retirada de areia no local. O comandante da operação teria
telefonado ao juiz Lincoln requerendo a expedição de ordem de prisão do
cacique, ao que o juiz teria respondido dizendo que não seria necessário, pois
Babau estaria descumprindo a ordem judicial que permitiu a retirada da areia e
a Polícia Militar poderia prendê-lo.
O juiz federal negou ainda a realização de
audiência de custódia a Babau e Teity, prevista em lei como ato imprescindível
de avaliação sobre a necessidade ou não da manutenção da prisão, e por telefone
determinou o encaminhamento dos detidos ao Presídio de Ilhéus. Há grave risco
de que Rosivaldo e José Aelson sofram violências ou mesmo atentado contra suas
vidas, conforme relato do próprio Cacique à Relatora Especial das Nações Unidas
sobre os Direitos dos Povos Indígenas por ocasião da sua visita à Aldeia
Tupinambá da Serra do Padeiro em 13 de março de 2016.
A Associação de Advogados de Trabalhadores
Rurais no Estado da Bahia – AATR -, que acompanhou a convite dos Caciques Babau
e Ramón Ytajibá a visita da Relatora às aldeias da Serra do Padeiro e Tikum,
enviou um requerimento à ONU para que apele ao governo brasileiro no sentido de
que a incolumidade física de Babau e Teity seja garantida. A Relatora já
apontava em sua Declaração de fim de missão, em 17 de março de 2016, os relatos
de tortura e prisões arbitrárias dentro de “um padrão sistemático de ameaças e
intimidação” sofrido pelos Tupinambá. A prisão de Babau e Teity se dá no espaço
de uma semana marcada por intensas violações de direitos no país:
Quinta-feira, 31 de março de 2016: na comunidade quilombola Cruzeiro, que
vivencia violento conflito agrário instaurado há quase uma década, no município
de Palmeirândia, norte do Maranhão, foi encontrado morto por disparo de arma de
fogo o quilombola conhecido por Zé Sapo;
Segunda-feira, 4 de abril de 2016: famílias do acampamento Hugo Chaves, do
Movimento de Trabalhadores Sem Terra – MST -, às margens da RO-140, em
Cacaulândia, no Vale do Jamari, em Rondônia, foram expulsas com disparos de
arma de fogo. E, na terça-feira, dia 05/04, descobriram pelas redes sociais que
suas casas foram atingidas por incêndio criminoso, enquanto as famílias estavam
abrigadas em alojamentos na cidade;
Quarta-feira, 6 de abril de 2016: o assentado da reforma agrária Ivanildo Francisco
da Silva, presidente municipal do Partido dos Trabalhadores e suplente de
vereador no município de Mogeiro, na Paraíba, foi assassinado com dois tiros de
calibre 12, morrendo na frente de sua filha de penas um ano; neste mesmo dia, o
Tribunal de Contas da União (TCU) determinou a paralisação imediata do programa
de reforma agrária do INCRA em todo o País, alegando irregularidades na
execução do programa, que devem ser investigadas de modo profundo, mas que se
constitui neste momento numa decisão oportunista e sem fundamento, que agrava a
situação das milhares de famílias acampadas pelo país, fragilizando-as no
momento em que o latifúndio não hesita em fazer uso da violência extrema contra
lideranças rurais.
Quinta-feira, 07 de abril de 2016: além da prisão dos Tupinambás pela manhã,
novamente famílias do MST, organizadas no Acampamento Dom Tomas Balduíno, no
município de Quedas do Iguaçu, Paraná, foram vítimas de uma emboscada promovida
pela Policia Militar e por seguranças privados da empresa Araupel. Foram assassinados
2 trabalhadores, deixando esposas (uma das quais grávida) e filhos. E outros 7
trabalhadores foram gravemente feridos.
Esta escalada da violência contra os povos do
campo e das cidades no Brasil vêm sendo denunciada por diversas entidades e
também pela AATR, que ao se manifestar sobre a atual conjuntura do golpe
parlamentar-judicial-midiático promovido neste momento pela velha direita
oligárquica, evidenciou que a usurpação dos territórios das Comunidades
Tradicionais, a paralisação da Reforma Agrária, a dilapidação de interesses
sociais e trabalhistas, a legitimação da violência física e institucional
contra camponeses e povos tradicionais são ações que possuem evidente recorte
de classe, gênero, raça e etnia, em favor dos interesses que detém os poderes
de Estado e das classes patronais urbanas e rurais, nacionais e transnacionais.
Entendendo que os recentes atentados à vida e
liberdade de Defensores de Humanos acima narrados fazem parte do atual plano de
desestabilização do processo democrático brasileiro, assim como a inconsequente
decisão do TCU que paralisa as ações de reforma agrária, a AATR reafirma neste
manifesto o seu compromisso com o Estado Democrático de Direito e a
concretização dos direitos fundamentais e sociais de toda população brasileira,
denunciando a paralisação das ações de Reforma Agrária, exigindo a liberdade
imediata do Cacique Babau e seu irmão Teity Tupinambá e garantia de sua
incolumidade física, sendo necessária a tomada de medidas urgentes pelo Estado
Brasileiro para garantir a segurança e o célere andamento das investigações
sobre todos os casos de violações citados, apurando os fatos e
responsabilizando todos os envolvidos nos atentados contra Defensores de
Direitos Humanos.
Salvador, 11 de abril de 2016
Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais - AATR
Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais - AATR
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