Milícia
armada desafia a lei no campo no Norte de Minas
Denúncia
de cerco a acampamento de sem-terra em Montes Claros é feita em audiência da
Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas.
Reportagem
da TV Assembleia da ALMG, dia 25/4/2018.
Sob o pretexto de defender a
paz no campo, expressão que dá nome ao movimento nacional organizado ao qual
supostamente pertencem, milícias armadas que atuariam sob a liderança
de latifundiários ameaçam transformar a zona rural do Norte de Minas em
uma zona de guerra. Esta foi a denúncia feita na tarde desta quarta-feira
(25/4/18) por lideranças do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST) e da Comissão Pastoral da Terra, apoiadas pelo representante do
Ministério Público, em audiência da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia
Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
O último lance dessa
escalada de violência teria acontecido na última quarta-feira (18), em um
acampamento do MST na Fazenda Bom Jesus, na saída de Montes Claros para Capitão
Enéas, às margens da Estrada da Produção (LMG-657).
Segundo relato dos
participantes da audiência, um grupo armado teria cercado o assentamento com
aproximadamente 100 famílias, com muitas crianças, e o isolamento, que impediu
a entrada até de água e alimentos, somente teria sido rompido com a intervenção
da Polícia Militar (PM). Tratores teriam sido usados para bloquear inclusive a
estrada.
Ameaça - Segundo
Antônio de Almeida Rodrigues, um dos coordenadores do MST em Minas Gerais,
durante todo o tempo os milicianos ameaçavam invadir o acampamento, que,
curiosamente, foi montado em uma área abandonada há muitos anos e pertencente à
Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (CODEMIG).
“Estava voltando para lá e
fiquei preso na confusão. Não me identifiquei e vários deles me disseram que
estavam armados e iam atacar o acampamento. Presenciei inclusive a chegada de
um micro-ônibus que trouxe mais gente contratada por eles. Então acionei a PM”,
contou.
“Mesmo na conversa com a PM,
quando dissemos que aquelas famílias não tinham para onde ir, eles insistiam
que não estavam lá para negociar, mas para nos tirar dali de qualquer jeito”,
acrescentou o líder do MST.
Desocupação
seguida de humilhação nas redes sociais
Após várias horas de
impasse, a situação se acalmou com a saída das famílias, comemorada pelos
milicianos com a queima da bandeira do MST, tudo devidamente registrado
em vídeos divulgados nas redes sociais, conforme foi relatado na
audiência. Os acampados foram recebidos em outro assentamento do MST em Montes
Claros.
"Eles desocuparam a
área para evitar um massacre”, reforçou o coordenador da Comissão Pastoral da
Terra, Frei Gilvander Luís Moreira. “Quem pensa em criar milícia armada para
reprimir essa luta justa e necessária está errado. O fazendeiro que com as suas
terras cumpre a função social pode dormir tranqüilo, que não tem risco de
ocupação”.
Segundo ele, a Constituição
Federal diz que as terras devolutas precisam ser resgatadas e destinadas à
reforma agrária. Ele é autor de uma tese de doutorado que aponta que 30% de
todas as terras brasileiras são devolutas, ou seja, pertencem ao Estado, que
ainda não lhes deu uma destinação. Esse percentual é de 23% em Minas Gerais.
“Se a reforma agrária não acontecer, conflitos assim nunca terão solução”,
lamentou.
Crimes - Diante
disso, a ação dos milicianos foi grave, na avaliação do advogado Élcio Pacheco,
membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG.
Os milicianos teriam
incorrido nos crimes de grave ameaça e incitação à violência, além de
cercearem o direito de ir e vir, previsto na Constituição Federal, conforme o
advogado.
“Uma área abandonada sem
cumprir função social foi ocupada de forma pacífica, e uma milícia rural não
tem legitimidade para execução da reintegração de posse. Ela tomou para si as
funções de Estado para supostamente coibir crime de esbulho possessório
(usurpação de terra), mas a propriedade não teve nenhum dono retirado do local
com emprego de violência”, defendeu Élcio Pacheco.
Deputado
Rogério Correia compara milicianos a fascistas
O deputado Rogério Correia
(PT) comparou a ação dos milicianos aos camisas negras que espalhavam o terror
nos estados fascistas. Segundo ele, trata-se de um reflexo do retrocesso
na promoção da reforma agrária pelo Estado.
Rogério Correia defendeu a
aprovação do Projeto de Lei (PL) 3.562/16,
de sua autoria, que estabelece protocolos para mediação de conflitos
fundiários rurais e urbanos no Estado. Além dele, a audiência desta quarta (25)
também foi solicitada pelos deputados petistas Cristiano Silveira, presidente
da comissão, Doutor Jean Freire e Paulo Guedes.
“Os trabalhadores têm poucos
instrumentos para luta, que não é compreendida e respeitada, enquanto a
estrutura estatal é feita para funcionar para quem sempre dominou o País”,
acrescentou Cristiano Silveira. “A única certeza é de que é importante continuar
lutando”, emendou.
MP - O
coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de
Conflitos Agrários do Ministério Público de Minas Gerais, o procurador de
Justiça Afonso Henrique de Miranda Teixeira, ressaltou ser necessário ao poder
público deixar claro que a ação de milícias armadas será tratada como uma
violação da lei, não apenas como manifestação para satisfazer a interesses
ideológicos. Para isso, segundo ele, é necessária uma ação mais efetiva
da Vara de Conflitos Agrários, sediada na Capital, que precisa estar mais
presente nos locais de conflito.
Fonte:
Site da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais, dia 26/4/2018.
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